A decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de taxar em 50% todas as exportações brasileiras, a partir de agosto, causou apreensão entre empresários, analistas e economistas de Mato Grosso do Sul. Segundo especialistas ouvidos pelo Correio do Estado, embora os efeitos práticos da medida ainda dependam de sua efetivação – dada a instabilidade do próprio histórico de Trump –, a iniciativa foi recebida como uma ameaça direta à competitividade dos produtos sul-mato-grossenses no segundo maior mercado de destino das exportações do Estado.
Por um lado, o impacto pode ser positivo em um momento inicial, porque pode haver uma compra antecipada da produção local. Em outro viés, há o risco da redução do envio ao mercado norte-americano, porque o produto brasileiro ficará mais caro aos compradores estadunidenses.
Ambas as possibilibidades afetarão o consumidor final. No caso da carne bovina, por exemplo, caso o envio ao exterior aumente, o produto ficará mais caro no mercado interno. Se houver redução do envio aos EUA, o alimento pode ficar mais barato no mercado local.
O presidente da Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul (Fiems), Sérgio Longen, classificou a medida como “inaceitável” e defendeu a via diplomática como a única solução viável. “Temos defendido a competitividade da indústria brasileira. Sobretaxar neste momento é algo difícil, é inaceitável nesses padrões. Entendemos que o presidente americano vem utilizando dessa estratégia com diversos países e chegou a vez do mercado brasileiro”.
Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic) apontam que as vendas somaram US$ 286 milhões (R$ 1,6 bilhão) de janeiro a junho deste ano, ante US$ 254 milhões no mesmo mês do ano passado (R$ 1,4 bilhão) – alta de 14%.
O mercado norte-americano representa cerca de 6% da pauta de exportações de Mato Grosso do Sul, bem longe do mercado chinês que consome 48% da produção sul-mato-grossense.
Entre os produtos mais exportados estão a carne bovina, o ferro fundido e a celulose – que, juntos, somam mais de 80% do total exportado. Longen alerta que todos esses segmentos sofrerão impacto direto.
O doutor em Economia e professor da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), Daniel Frainer, aponta que a medida tem mais motivações políticas do que econômicas. “Essa questão é uma questão política, não é uma questão econômica, justamente por conta dessa questão do processo contra o ex-presidente Bolsonaro que começou todo esse ‘zunzunzum’ dele em relação ao envio dessa carta dos 50%”, disse.
Para Frainer, Trump tem um histórico de recuos e falta de previsibilidade em políticas tarifárias. “Ele tem esse vai e vem das políticas, então a gente não tem uma credibilidade que isso se sustente nem no curto nem no médio prazo”.
Em relação a impactos diretos, Frainer explica que, no caso de Mato Grosso do Sul, não há efeito econômico negativo imediato, uma vez que o custo das tarifas será repassado aos consumidores norte-americanos. “A tarifação só traz efeitos negativos para a economia norte-americana. Para o Brasil, não traz, nem para Mato Grosso do Sul, por conta de que quem vai pagar esses preços maiores vão ser os consumidores no mercado norte-americano.”
Ele descreve três possíveis cenários. O primeiro, considerado improvável, é o de manutenção da tarifa no longo prazo, o que geraria inflação de custos nos EUA, com elevação de preços e perda de competitividade dos produtos americanos. O segundo, mais plausível, seria a antecipação das compras por parte dos importadores dos Estados Unidos.
“Com essa antecipação das compras, nós teríamos um aumento significativo das exportações locais. Em vez de eles comprarem o previsto para 30 dias, estariam comprando o previsto para 90 dias. Nós teríamos, em alguns produtos, praticamente a triplicação da demanda”.
O terceiro cenário, ainda mais improvável segundo Frainer, seria a substituição do Brasil por outros fornecedores, o que demandaria tempo e aumento dos custos logísticos.

AJUSTES
O economista Eduardo Matos também vê espaço para ajustes ou reversão da medida. Para ele, embora os impactos iniciais possam ser negativos, Mato Grosso do Sul possui uma pauta exportadora diversificada e vem ampliando sua rede de parceiros comerciais.
“Mesmo que nesse primeiro momento sinta-se alguma consequência desse ato, a tendência é que isso se ajuste da melhor forma possível com o recuo da decisão do presidente norte-americano ou então com uma diversificação ainda maior dos nossos parceiros comerciais”, avaliou.
Ele destacou que o valor exportado por Mato Grosso do Sul para os Estados Unidos mais do que dobrou no período pós-pandemia, o que reforça a importância da manutenção da relação bilateral.
“É muito plausível que haja um recuo dessa decisão, tendo em vista principalmente que os Estados Unidos, nos últimos anos, entraram em guerra comercial com a China. Parcerias estratégicas, como é o caso do Brasil, são muito mais do que favoráveis para o país norte-americano”.
Para o analista de comércio exterior Aldo Barrigosse, há riscos à competitividade e possíveis perdas de investimentos. “A recente tarifa de 50% imposta pelos EUA sobre nossas exportações é um golpe significativo. Isso resultará em preços mais altos para os consumidores americanos, potencialmente impactando sua inflação, e forçará nossos produtores a buscarem novos mercados ou enfrentarem uma retração nas vendas, afetando diretamente a economia sul-mato-grossense”, concluiu.