Cinco deputados federais sul-mato-grossenses votaram a favor, na madrugada de hoje (17), por volta das 2h da manhã, do projeto de lei que dispensa a necessidade de licenciamento ambiental para ampliação de estradas e atividades de agricultura e pecuária; renova automaticamente a licença, a partir de declaração do empreendedor feita pela internet, e permite a autodeclaração a projetos de médio porte com potencial poluidor.
Dois parlamentares do estado foram contrários e um não votou. O texto foi aprovado com 267 votos favoráveis e 116 contrários. Agora, segue para sanção do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva
O Projeto de Lei 2159/21 é criticado por entidades ambientalistas, tanto que após a votação, o Observatório do Clima, rede que reúne 133 organizações ambientalistas, institutos de pesquisa e movimentos sociais, divulgou nota na qual afirma que
“O Congresso Nacional desmontou na madrugada desta quinta-feira o principal instrumento de controle dos impactos ambientais de empreendimentos no país. [A votação] ocorre a menos de quatro meses da COP30, a conferência do Clima da ONU que será realizada em Belém”, diz o documento.
Já o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), disse que o presidente da República deve vetar artigos do projeto na sanção da matéria. O coordenador da Frente Parlamentar Mista Ambientalista, deputado Nilto Tatto (PT-SP), afirmou que o texto não resolve os gargalos de licenciamento ambiental e a deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP), destacou que “estamos falando em rasgar qualquer análise técnica de estudo e impacto sobre o meio ambiente, sobre a saúde das pessoas e sobre a possibilidade de vida e futuro”, criticou a deputada.
Entretanto, o coordenador da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Pedro Lupion (PP-PR), lembrou que várias obras ferroviárias pelo Brasil estão paradas esperando o licenciamento ambiental, a desburocratização e a racionalização de processos para o Brasil “crescer e se desenvolver como merece”.
De Mato Grosso do sul, os deputados federais Geraldo Resende (PSDB), Beto Pereira (PSDB) e Dr. Luiz Ovando (PP) defenderam o texto, afirmando que as mudanças aprovadas garantem agilidade na emissão das licenças ambientais, que hoje chegam a demorar vários anos. Eles votaram a favor, bem como os deputados federais Marcos Pollon e Rodolfo Nogueira (os dois do PL).
O deputado Geraldo Resende afirmou que “essa proposta traz segurança jurídica ao setor produtivo, sem abrir mão de proteger o meio ambiente” destacando que “é um avanço importante para destravar investimentos, gerar emprego e renda, especialmente em estados como o Mato Grosso do Sul, que têm na agropecuária, na indústria e na infraestrutura pilares essenciais de sua economia.”
Beto Pereira enfatizou que o texto “moderniza o licenciamento ambiental no Brasil”, sendo que “o regramento por adesão (previsto no texto) é compromisso que garante agilidade paras as atividades de baixo impacto.
Já o Dr. Luiz Ovando destacou que o texto solta as “amarras da ideologia ambientalista de esquerda que tudo atravanca e impõe a presença opressora do estado tirando agilidade nas decisões e perspectiva de progresso”.
Com opiniões divergentes e por isso votaram contra, os deputados federais Camila Jara e Vander Loubet (ambos do PT) destacaram os riscos para o meio ambiente com a flexibilização das regras das licenças ambientais.
Jara afirmou que “o interesse econômico não pode falar mais alto do que o direito coletivo à natureza e à vida. Dar autonomia para a concessão do licenciamento ambiental, sem critérios nacionais claros, abre margem para flexibilizações perigosas. É um projeto que não só acelera processos, mas também eleva o risco de vivermos tragédias como Mariana e Brumadinho novamente. Sem análise técnica adequada, qualquer empreendimento pode ser considerado de baixo risco.”
Loubet ressaltou que “os especialistas na área apontam é que pode ter um efeito contrário, por causa de dispositivos inconstitucionais que vão acabar gerando a judicialização dos processos de licenciamento”, citando que haverá enfraquecimento dos órgãos federais de defesa do meio ambiente, sendo que para ele “não haveria problema em os órgãos estaduais ganharem relevância, desde que o Ibama não fosse preterido no processo de licenciamento ambiental.” Essa preocupação existe porque o PL permite que as licenças ambientais sejam concedidos por governos estaduais.
O deputado federal Dagoberto Nogueira (PSDB) não votou.
O projeto tramitou por 17 anos na Câmara dos Deputados e foi aprovado em 2021. Naquele ano foi encaminhado ao Senado Federal e somente aprovado depois de quatro anos, após muitas negociações. A senadora sul-mato-grossense Tereza Cristina (PP-MS) relatou o projeto em plenário e alegou que o texto deveria ser aprovado porque a legislação atual configura um verdadeiro cipoal com cerca de 27 mil normativos.
De acordo com a Agência Câmara, essas são as mudanças aprovadas pelos deputados federais.
Licença Ambiental Especial
Uma das emendas aprovadas na madrugada de hoje cria um novo tipo de licenciamento ambiental, chamado de Licença Ambiental Especial (LAE), que poderá ser concedida mesmo se o empreendimento for efetiva ou potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente.
Esse tipo de licença poderá ser usada para atividades ou empreendimentos considerados estratégicos pelo Conselho de Governo, órgão de assessoramento do presidente da República quanto à política ambiental.Com prazo de 12 meses para conclusão da análise e decisão sobre o pedido de licença, a LAE terá prazo de validade de 5 a 10 anos. A análise da LAE deverá ocorrer em uma única fase, e a autoridade licenciadora poderá solicitar informações adicionais uma única vez.
Outros órgãos que precisem emitir licenças deverão dar prioridade à emissão de anuências, licenças, autorizações, certidões, outorgas e demais documentos necessários em qualquer esfera administrativa.
Mineração
Quanto à mineração de grande porte e/ou alto risco, com aprovação de emenda dos senadores, não serão mais observadas normas do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) até lei específica tratar do tema.
Licença por adesão
Um licenciamento ambiental simplificado por adesão e compromisso (LAC) poderá ser pedido pelo interessado sem necessidade de estudos de impacto.
Cada ente federativo, conforme a competência concorrente de licenciamento ambiental, definirá quais atividades de pequeno ou médio porte e baixo ou médio potencial poluidor poderão usar a LAC, cuja vigência será de 5 a 10 anos.
O uso dessa licença poderá ocorrer se forem atendidas, de forma cumulativa, certas condições, como conhecimento prévio das características gerais da região e de como se darão a instalação e a operação da atividade, os impactos ambientais do tipo de empreendimento e as medidas de controle ambiental necessárias.
Além disso, a intervenção não poderá derrubar vegetação se isso depender de autorização ambiental.
Para obter a licença, o empreendedor deverá apresentar o Relatório de Caracterização do Empreendimento (RCE), mas devido a emenda aprovada a análise por amostragem dessas informações será facultativa em vez de obrigatória. Já as vistorias por amostragem no local passam a ser anuais para conferir a regularidade de atividades autorizadas por meio da LAC.
A LAC poderá ser utilizada para serviços e obras de duplicação de rodovias ou pavimentação naquelas já existentes ou em faixas de domínio; e ampliação e instalação de linhas de transmissão nas faixas de domínio.
Entretanto, outra emenda aprovada incluiu em trecho diferente do texto dispositivo que dispensa de licenciamento ambiental serviços e obras de manutenção e melhoramento de infraestrutura em instalações existentes ou em faixas de domínio e de servidão, incluídas rodovias anteriormente pavimentadas e dragagens de manutenção.
Autoridades envolvidas
Uma das emendas aprovadas retira de outras autoridades envolvidas no licenciamento ambiental o poder de definir os tipos de atividades ou empreendimentos de cujos licenciamentos deverão participar.
Isso envolve órgãos que devem se manifestar sobre impactos em terras indígenas (Funai) ou quilombolas (Ministério da Igualdade Racial), sobre o patrimônio cultural acautelado (Iphan) ou sobre as unidades de conservação da natureza (ICMBio).
No entanto, o prazo total de prorrogação para que as entidades envolvidas no licenciamento ambiental apresentem seu parecer passa de 10 para 15 dias a mais do prazo padrão de 30 dias. Essa prorrogação precisará de justificativa.
Como o novo texto, a manifestação dessas autoridades deverá ser considerada pela autoridade licenciadora apenas se apresentada no prazo fixado.
Ao mesmo tempo, autoridade ambiental licenciadora não precisará mais avaliar e decidir motivadamente sobre a justificativa da autoridade envolvida quanto ao impacto do empreendimento. Sobre terras indígenas, por exemplo, o projeto permite a manifestação da Funai apenas sobre aquelas com demarcação já homologada.
Termo de referência
Para atividades e empreendimentos que dependam apenas de um termo de referência, com estudos menos complexos, a participação de outros órgãos dependerá de as terras, bens tombados ou unidades de conservação estarem próximos do local da intervenção no meio ambiente.
A distância depende ainda do tipo de empreendimento. Assim, por exemplo, na Amazônia, haverá consulta se a distância for de até 8 km para implantação de ferrovias, portos, hidrelétricas sem reservatório e mineração. Em outros biomas, a distância será de 5 km para esses casos, exceto ferrovias (3 km).
Produção indígena
Esses órgãos e a autoridade ambiental poderão cooperar para disciplinar procedimentos específicos para licenciamentos cujos empreendedores sejam indígenas ou quilombolas quando as atividades forem realizadas dentro de suas respectivas terras.
Unidades de conservação
Quando o empreendimento afetar unidade de conservação específica ou sua zona de amortecimento, o licenciamento não precisará mais da autorização do órgão responsável por sua administração (no caso federal, o ICMBio).
Ibama X órgãos estaduais
Outra mudança feita pelos senadores e acatada pela Câmara determina que, se órgãos ambientais fiscalizarem atividades sob licença não expedida por eles, deverão apenas comunicar ao órgão licenciador as medidas para evitar a degradação ambiental verificada em autuação.
O órgão licenciador poderá inclusive decidir que não houve infração, o que tornaria sem efeito as multas aplicadas por aquele órgão que fiscalizou.
Renovação automática
O texto permite ainda a renovação automática da licença ambiental por igual período a partir de declaração on-line do empreendedor na qual ele ateste o atendimento da legislação ambiental e das características e porte do empreendimento e das condicionantes ambientais aplicáveis.
Isso será válido para empreendimentos de baixo ou médio potencial poluidor e de pequeno ou médio porte.
Fonte: Clodoaldo Silva/Correio do Estado